Por Alex Pipkin
Eu confesso: tenho vergonha (eu tonho nojo) do Supremo Tribunal Federal. E sei que não estou só.
A última pesquisa Datafolha aponta que 58% dos brasileiros compartilham desse sentimento — o que, sinceramente, me parece modesto. No Brasil de hoje, até responder a uma pesquisa exige cautela. O silêncio do brasileiro, esse sim, fala alto. Multiplique os dados oficiais por 0,70 e terá algo mais próximo da realidade moral do país.
A verdade — essa senhora maltratada por sentenças ideológicas — é que o STF não protege liberdades: administra-as conforme o humor do dia. A Corte que deveria garantir o direito de opinar passou a decidir o que é opinião e o que é crime. Pensar virou atividade de risco. Criticar, um ato subversivo. E discordar, quase heresia.
Mas que democracia é essa? A que prende quem fala e absolve quem rouba? A que censura jornalistas, cala parlamentares e reescreve a Constituição sem mandato? É a democracia dos iluminados, que se julgam intérpretes exclusivos da vontade popular — mesmo quando o povo já lhes virou as costas. Se a maioria tem vergonha da Corte, ela já não pode falar em nome da democracia. Apenas em nome de si.
Eles falam em república, mas vivem como monarcas. E não apenas monarcas — monarcas gourmet. Vinhos premiados, lagostas averbadas, férias em série, e uma superioridade moral que escorre pela beca como azeite trufado. Enquanto o cidadão espera anos por sua aposentadoria, a Corte resolve, em sete dias, descondenar o demiurgo de Garanhuns, com direito a absolvição por quem jamais o julgou. Ao mesmo tempo, apressa julgamentos para punir, com teatralidade, o adversário político da vez.
E julgavam o povo com mãos limpas de sangue, mas olhos sujos de poder.
Vocês lembram — ou preferem esquecer — daquela cena entre Luiz Roberto Barroso e Gilmar Mendes? Já faz alguns anos, mas a vergonha continua viva. Barroso, no auge da sua iluminação retórica, acusou: “Vossa Excelência envergonha esta Corte.” Vossa Excelência! (Risos.) E o que veio depois? Nada. Apenas o silêncio de quem sabe que a Corte inteira, ali, já estava desmoralizada. Confraria da toga preta.
Ali estava o retrato da decadência institucional: dois ministros duelando no plenário como se disputassem a última taça no coquetel do poder. Não era mais direito, era vaidade. Uma Corte em guerra consigo mesma, e o povo como espectador e réu.
Por isso escrevo com ironia. Porque só a ironia ainda é capaz de dizer a verdade neste país sem algemas. A ironia é o último recurso da lucidez num ambiente onde a lógica foi condenada por unanimidade. Ela não disfarça — revela. Como o espelho que escapa do controle de Narciso.
Enquanto isso, os togados vivem sua Nárnia tropical. São salários indecentes, benefícios obscenos, jantares privados com dinheiro público, blindagem perpétua. Pregam o “coletivo”, mas defendem privilégios com unhas e liminares. Falam em moral enquanto gozam, blindados, de uma obscenidade funcional. Essa Corte não julga — catequiza. Não interpreta a Constituição — a reescreve conforme a liturgia do momento.
E nós? Assistimos. Murmuramos. Às vezes ousamos discordar em voz baixa. Mas no fundo, sabemos: um povo que cala diante da injustiça, um povo que se curva ao tribunal dos deuses, não é inocente — transforma-se em cúmplice. Não por maldade, mas por medo. Medo que paralisa, que adormece, que torna a servidão confortável.
Não, eu não sou contra a Justiça. Sou contra esse simulacro, essa encenação melancólica, essa farsa solene onde o povo não tem voz, nem voto, nem vez. Um teatro de casta, onde os intérpretes se aplaudem e os críticos são calados pelo camburão da moral oficial.
58% dizem sentir vergonha? O Brasil inteiro já entendeu o teatro. Só falta levantar do banco e sair da plateia.
Ou será que já vivemos no Admirável Mundo Novo — e ainda não nos demos conta?
Ou reagimos como cidadãos, ou nos restará apenas rezar como súditos.
Pontocritico.com
Source: RS Notícias: A CORTE DOS ILUMINADOS: CRÔNICA DE UMA VERGONHA SUPREMA – 30.06.25
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